Amor é imprudência.
É inventar desculpa pra sentar do lado de um estranho em um
bar qualquer só pra ouvir de perto aquele sotaque.
É passar horas de uma noite descobrindo afinidades,
coincidências assustadoras e farfalhar na imaginação. É pensar que a luta no
ringue adiante não devia acabar, mas dar mais tempo ao embate silencioso de
olhos.
É quando todo mínimo toque é muito e o muito é, ainda assim,
pouco: É querer mais.
É quando na primeira despedida se sente as pernas trocarem e
a incerteza vir em forma de suor de mãos. É o espaço de tempo que divide a entrega de um numero-convite em papel e o olho que segue até não alcançar
mais: Se chama despedida cinza.
No amor, toda casualidade é farol. Brilha na luz da
hesitação. Grita no ouvido, ainda que a teimosia da dúvida se faça de âncora.
[Não existem dúvidas no amor, tudo é certeza tímida que acena e faz charminho]
Amor é quando se descobre no primeiro beijo que o mundo explodiu.
Que não existe outro, outras, outrem.
Aquele primeiro é o último primeiro beijo que se quer.
Amor torce o cronômetro e avessa a física: quando menos se espera a visita dobrou o sol, guardou no
bolso e tornou a soltar na manhã seguinte (e não se fica satisfeito). A
ampulheta deita e assim se congela o tempo.
É quando o nariz descobre que o pescoço é praça de
passeio constante. Quando se vira pintor surrealista de aquarela imaginária nas
costas do ser amado: o dorso curvo é uma tela que nunca se acaba de pintar.
Amor é janela de cego. Mapa em braile a se traçar e repetir com dedos atenciosos e curiosos: uma descoberta nova e familiar à cada toque numa rotina que nunca se cansa.
É amor quando seu banheiro vira varal e sua cama ganha
travesseiros novos: Amor é designer de interiores, seja de cômodos ex-solteiros, seja de coração-sala ex-vazia.
É acordar no meio da noite e sentir no braço dormente o
aconchego confortável dos amantes: formigamento na alma e no corpo, convulsão sorridente.
Amor é quando se é imprudente. Quando se morde a língua e
faz o que prometeu nunca fazer. É apostar alto: Não há espaço para blefes na mesa
do café da manha.
Amor é feito relâmpago, que surge antes do barulho. É fatal
na vida de um e funde dois. Faz bater coração de lata e transformar pedra em
suspiro: constrangimento consentido diante da plateia de amigos.
Amor não tem vergonha. Amor é sem vergonha. Se livra de roupas com a facilidade que um cigarro se esvai. Sim, pode fumar aqui.
Amor não é quando completa, mas quando acrescenta. É somar
com cara de dividir numa operação matemática complexa que se resolve um dia por
vez, mas se define as variáveis num único beijo que se repete com todos os
exageros que a vida permite:Todo amor é teórico-prático de insurreições algébricas de corpo-alma.
Amor é inconsequente e renova todos os dias a promessa
rebelde de revolução entre as colchas, entre as coxas, entre as conchas. É uma
criança com uma caixa cheia de dinamites. Amor é acender o pavio e esperar junto
pela explosão: explosão, incêndio e nunca cinzas. Sempre fogo, mesmo quando o coração
muda de salsa para tango.
Amor é tudo isso e um pouco daquilo com uma pitada daquilo
outro. Amor não é um amontoado de anos – tempo tempo tempo – amor é um dia por
vez, sem virar a folha do calendário: no amor, é sempre hoje.
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