terça-feira, setembro 19, 2006

Teresa e seus amores - Parte II

Do mundo dos sonhos, retorna o desconstrutor com mais um pedacinho de Teresa...
PARTE II DE IV
[continuação]
“ Teresa não conseguia esquecer aquele índio lindo, e em seu sono chamou por ele. Estava caminhando naquela chapada alta. Faceira, colhia flores. Poty a acompanhava com os olhos, se escondendo no assovio do vento das asas dos pássaros dali e no deslize das folhas. Teresa sabia que ele estava lá, mas fingia que não havia notado. Gostava de brincar daquele jeito. Uma brisa correu e mordeu sua orelha:
- vem menina da noite nos olhos. A floresta inteira esqueceu como cantar quando tu foste pra longe. - Sussurrou no ouvido dela. Saiu tão rápido quanto veio, e ela então acordou. Acordou e encontrou três penas no travesseiro: uma verde, uma amarela e uma branca.
Teresa arrumou as penas em um colar e correu em busca do vento. Entrou fundo na mata, sem medo. Na verdade adentrava do domínio de seus sonhos, que eram frondosas árvores de frutos adocicados. Embaixo do Cajueiro d´ouro sentou esperando seu amado.
O vento, sorrateiro como ele, esgueirou-se entre as folhas e sussurrou docemente:
- Sabia que você viria... -Dobrou no ar, levantando folhas.
- Minha curiosidade sempre vence meus pés...
- Belas penas ornamentam seu pescoço. -Riu o índio sentindo-se convencido.
- Surpresas que o vento traz durante os sonhos. -Brincou ela enroscando os dedos no colar.
O vento levantou folhas no ar, rodopiou e deu forma ao índio dourado com pinturas coloridas no corpo e pulseiras trançadas de penas brancas, verdes e amarelas. Ele sorria largamente.
Os olhos de Teresa brilhavam. Tinha um sorriso poético nos lábios.
Poty era da floresta como o açúcar é dos sonhos. Conhecia cada pedra, árvore criatura e som. Conduziu Teresa por caminhos que os homens acordados não conhecem. Catou para ela flores únicas, de cores variadas e cada uma delas tinha uma nota musical. Um ramalhete de cores e música, presas por duas flores de cor incerta: um bemol para dias tristes e um sustenido para dias melhores.
Poty ensinou à Teresa como se vestir de bicho, se esconder sob escamas de peixe, enxergar como o anum e a correr como a capivara. Teresa se perdia sem notar (nem resistir). Poty ensinou à Teresa como arrancar o sangue-tinta das sementes miúdas, para pintar desejos vermelhos em sua imaginação.
- Eu nunca havia visto um vermelho como esse. -disse Teresa olhando para os dedos manchados.
- Foi o desejo em pessoa que misturou tons até chegar a essa cor. Pra proteger seu tesouro, o vermelho único, o escondeu no ventre marrom do urucum-sem-graça.
Teresa esticou os dedos vermelhos e começou a desenhar no ar. Escreveu seu nome tão junto ao de Poty que não se podia dizer onde terminava um e começava o outro. O índio ficou tão maravilhado que mal percebia o vento fugindo de suas asas pra dançar com as folhas.
- Você consegue desenhar sons...
Teresa ria vitoriosa. Prendera Poty ainda mais em seus encantos.
- Desenhar sons é escrever a alma. Ensino a você.
Poty ensinou à Teresa os segredos da mata. Teresa ensinou a Poty a poesia desenhada.
Os dois sentaram sob o Cajueiro d`ouro e conversaram como se já se conhecessem desde sempre. A noite nos olhos dela roubaram o coração de Poty e os dele faziam-na tremer. Conversaram sobre a mágica no vento, verde das árvores e a tinta dos sonhos, pois aquele povo-pássaro sabia bem de sonhos...”

- Teresa fazia poemas, mamãedinha?
- Teresa por si só era um poema.
- E ensinou ele a escrever...
A garota ficou perdida com um olhar distante.
- Ensinou ele a desenhar sons, escrever a alma... Teresa tinha um dom secreto, que nem mesmo ela sabia possuir: tudo o que tocava virava arte, poesia e melodia.

“O índio-pássaro rodopiou em forma de vento ao redor da filha da noite, deslizando entre as árvores, fazendo uma doce melodia flutuante surgir. Teresa dançava fazendo seu vestido se misturar com o próprio vento. Começava a cantar...”

- Mas ela não tinha voz de trovão?
Indagou a pequenina.
- Sim. Cantava com uma voz de trovão, mas daqueles trovões de chuva calma da madrugada, que lhe embalam o sono de uma forma mágica. Faz você dormir sorrindo, se perdendo entre as cobertas.
[continua...]

3 comentários:

Claudio Eugenio Luz disse...

Meu caro, Teresa já nasce como uma linda fabula; um história, cuja matriz, remonta a um tempo perdido, porem, não esquecido. Meus parabéns. Quero saber onde essa narrativa vai me levar.

hábraços

Bell... disse...

"- Desenhar sons é escrever a alma. Ensino a você."
estou roubando, com os devidos creditos à ti, la no Faces..
Teresa me estiga.
continue, por favor.
bjs meus.

Edilson Pantoja disse...

Fui buscar Teresa desde baixo, gostando...
Abraço!